28.7.13

Anjo torto



A noite passada um anjo torto veio me visitar. Pediu gentis desculpas pela sua "desangelical" beleza, mas era o único anjo que aceitou me dedicar alguma atenção.
- "Não te preocupe com isso, meu caro." Falei ainda confuso. "Pois eis que também sou torto na minha forma de ser."
Sentou-se sobre o criado mudo ao lado da cama. Serviu-se de uma taça de vinho. Olhou distante. Depois degustou o vinho em silêncio. Aguardei também silencioso. Afinal, quem seria ousado de interferir naquilo que os anjos fazem. Por mais estranho que sejam?
Serviu outra taça de vinho e a colocou no chão, logo à frente dos seus pés pequeninos que balançavam no ar. Suas asinhas reluziam ouro. Exalava um perfume de lírios do campo. Olhou nos meus olhos com tal profundidade que me senti constrangido. Disse-me, então:
- "Ser um pouco torto às vezes é bom, porque nos possibilita ver a vida como ela é, ao invés de imagina-la sempre reta."
Continuei em silêncio. Um silêncio inquietante que elevou minha taquicardia à milionésima potência.
- "Vim apenas dizer que um anjo belo, cujo sorriso furtou do Deus Sol, virá amanhã para te encontrar."
Pegou a taça de vinho no chão e saiu apressado pela janela.
Dormi como se fosse só um desses sonhos malucos que o inconsciente traz.
Hoje acordei com a esperança na alma. Com um pouco de dúvida e estranheza passeio o dia desejando que o sonho poderia ser real.
Chegou a noite novamente. O sol brilhou e não recebi a visita do anjo anunciado.
Vou dormir novamente, sem desejo de sonhos místicos. Não quero saber dessa história de anjo torto pregando mentiras malvadas com o coração. Contudo, deitarei em meu leito com uma dúvida:
- "Foi pura maldade ou preciso aprender a não duvidar do improvável para que o provável aconteça?"

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